Discurso que fizemos no final da manifestação Casa para viver, planeta para habitar!, dia 30 de Setembro de 2023 em Lisboa, em nome do bloco “Colectividades em luta”.

 

Somos as colectividades, as associações, as cooperativas e os espaços sociais unidas na luta pela justiça climática e pelo direito à habitação!

São as mesmas pressões da especulação imobiliária, os mesmos interesses financeiros e as mesmas políticas que os promovem que nos expulsam de casa e que expulsam também as nossas casas colectivas. Cada vez mais, os espaços colectivos estão a fechar, ou a ter de travar uma luta constante pela sua sobrevivência. Está mais que na hora de nos opormos a este rumo! As nossas ideias, os nossos desejos, a nossa necessidade de fazermos coisas em conjunto não cabem nos nossos quartinhos em apartamentos encafuados. Precisamos de espaços colectivos, precisamos de mais e não de menos!

Nos nossos espaços cabem o convívio, a recreação, o encontro, o debate, o desporto, a cultura, o apoio mútuo, a cooperação, a iniciativa popular, a ecologia, a experimentação artística, a organização colectiva. Tudo isto é posto em risco com as crescentes ameaças de despejo que enfrentamos, com as rendas absurdas que nos propõem.

Muitos são os espaços que já fecharam portas nos últimos anos — recordemos por exemplo o Grupo Recreativo e Excursionista “Amigos do Minho”, o Lusitano Clube em Alfama, o Grupo Excursionista Vai Tu na Bica, ou o Sport Club Intendente, para mencionar apenas alguns casos emblemáticos e históricos. Passar por estes lugares hoje é encontrar prédios fechados, janelas e portas emparedadas ou edifícios encerrados a gente como nós, porque foram transformados em condomínios de luxo, em hotéis ou em alojamento local.

Muitos são os colectivos e associações que querem ter espaço próprio, que precisam de ter espaço próprio, e não conseguem.

Outros tantos vivem com a corda ao pescoço. Actualmente, estão em risco de perderem os seus espaços, por exemplo, projectos tão diversos como o Centro de Cultura Libertária em Cacilhas, a SMOP – Sociedade Musical Ordem e Progresso na Lapa, que faz este ano 125 anos de vida, e cujo espaço será em breve transformado para Alojamento Local, a Zona Franca nos Anjos, a Fábrica de Alternativas, em Algés, o Arroz Estúdios, em Xabregas, ou o STOP, no Porto, entre outros. A associação a que pertenço, a Sirigaita, no Intendente, que foi uma das bases para a organização desta mesma manifestação, aliás, também enfrenta um despejo nos próximos meses. Mas não pensem que nos rendemos! E não nos rendemos não propriamente por sermos românticas incuráveis, mas porque achamos que ainda é possível resistir, que a cidade não foi toda para o galheiro, que não é tempo de abandonar e deixar isto para os turistas e para os unicórnios, que ainda há muito a fazer, muito que salvar, muito que conquistar. Mas vamos precisar da ajuda e da energia de todas as pessoas para resistir.

Acreditamos que são as colectividades enquanto espaços não-comerciais, onde, em vez do lucro e da competição, reinam a solidariedade e a amizade, que nos permitem respirar livremente nas nossas cidades. Acreditamos que a cultura, o desporto, a política, a troca de ideias, a arte, não são só coisas para consumir, comprar o bilhete e assistir ao longe, caladinhas, são para se fazer, são parte da vida! Somos muitas colectividades, dedicamo-nos a coisas diferentes, mas unimo-nos numa só luta: para que os nossos espaços possam continuar a existir, para que as nossas vidas possam ser inteiras.

Somos contra a cidade-gourmet, estandardizada, oca, sem vida. Queremos cidades acolhedoras, multiculturais, insubmissas, habitáveis!, que sejam lugares de partilha, de prazer e de luta. Queremos espaços populares onde não temos de pagar para
simplesmente estar, onde se experimentam e imaginam outros modos de vida, em conjunto. Cidades vividas e não vendidas.

Por tudo isto, unimo-nos e vamos ficar unidas para que os nossos espaços tenham lugar, em Lisboa como noutras cidades. Hoje demos mais um passo nesta resistência. Não é um início nem um fim: vamos ocupar Lisboa canto a canto. Unidas vamos retomar a cidade!

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *